O abuso da cafeína
Ele há por aí, dentro do que se designa por Direita, gente que:
- Tem uma insondável admiração pelos E.U.A., as liberdades americanas, o capitalismo americano e os Pais Fundadores.
- Detesta o cidadão americano médio, que nem sequer sabe usar em simultâneo o garfo e a faca, julga que o centro do Mundo fica no Minnesota, e que a História começou em 1776 e os E.U.A. têm uma missão civilizadora.
- Apoia a "construção europeia", designação consagrada para a gravidez dos futuros Estados Unidos da Europa.
- Abomina a dissolução do que resta da independência nacional num estado federal onde Portugal teria, apesar de muita treta, a liberdade de fazer o que lhe mandam, com a mesma influência que tem o Arkansas na América.
- É a favor da despenalização do consumo, produção e compra e venda de drogas, mesmo duras, em nome do realismo no combate ao crime e da liberdade individual.
- Entende que o combate ao tráfico e consumo de drogas deve prosseguir, por a desistência do Estado ter um efeito dissolvente na sociedade e representar uma inadmissível neutralidade.
- Considera a desigualdade económica entre os cidadãos algo que o Estado deve activamente combater, via redistribuição fiscal.
- Acha que a redistribuição fiscal, se acentuada, tem um efeito de distorção no funcionamento do mercado, e é por isso inerentemente penalizadora do investimento e por consequência do progresso material.
- É a favor, ou contra, o abortamento, as proibições higieno-fascistas, a adopção por casais gays, o laicismo do Estado e ainda quase tudo e o seu contrário.
Bem, tudo tudo não: não há na Direita, pelo menos em teoria e apenas como exemplos que não são exaustivos, adeptos do crescimento do Estado e da despesa pública, da economia vudu e do Estado compreensivo para o criminoso e suspeitoso do homem bem-sucedido; e há uma prevalência de valores conservadores, de pessimismo sobre a inerente bondade da natureza humana, e de crença na realização do bem comum através da mão invisível do mercado.
Uma grande complicação, em suma - nada que quem está de fora verdadeiramente entenda. Ou queira entender.
E porque me lembrei de, ao correr da pena, expectorar estas profundas considerações, alinhadas entre o terceiro café e a hora do almoço, não divulgo.