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Forte Apache

Por estes dias...

Fernando Moreira de Sá, 26.11.12

 

 

No Chicago Tribune, podem ler um artigo bastante crítico a Hollande e aconselhando-o a seguir o exemplo do governo português. Não fiquei surpreendido. Como sabem aqueles que leram os meus últimos escritos sobre o governo e as medidas que estão a ser seguidas, continuo muito céptico das opções fiscais seguidas pelo ministro das finanças. Não tenho nem evitado nem escondido as minhas sérias dúvidas (ler os artigos "Matar o doente com a cura").

 

No último fim de semana, na TSF, tive a oportunidade de ouvir o discurso de Pedro Passos Coelho na Madeira. Salvo melhor opinião, esta foi a sua melhor intervenção dos últimos meses. Explicou com clareza e foi, finalmente, um discurso político. É raro ver um político assumir e defender um caminho que, obvimente, é impopular. O objectivo dos politiqueiros é ganhar sempre e a qualquer custo. Os políticos a sério e sérios preferem fazer o que ainda não foi feito e precisa de o ser, mesmo que seja impopular. A sua decisão terá, na minha opinião, consequências terríveis para o seu partido já nas autárquicas de 2013. A minha dúvida reside apenas num ponto e que ponto: será este o caminho correcto para endireitar o país? Será desta forma que vamos ter uma economia saudável? Não sei. Na minha opinião, a política fiscal seguida por Gaspar vai prejudicar toda a estratégia (o melhor exemplo é o IVA da restauração). Não acredito que com esta gigantesca carga fiscal se recupere as finanças e a economia. O IVA e o IRS podem representar a morte da já diminuta classe média. Vamos ver. Posso, espero, estar enganado. 

 

Contudo, os portugueses, demonstram a sua inteligência. A oposição, sobretudo o PS, não apresenta alternativas. O Partido Socialista está enredado numa pouco discreta luta interna de poder com Seguro a fazer verdadeiros "pactos internos com o Diabo" e Costa a somar apoios atrás de apoios, até nas hostes de Seguro. Hoje, para mal dos nossos pecados, temos um Secretário-geral do PS que sempre que faz uma intervenção política está a falar para dentro, a procurar retirar espaço aos seus opositores em vez de falar para o país e se constituir, a si e ao seu partido, como uma alternativa. Ironicamente, faz mais oposição ao governo o CDS (simulando estar fora quando está dentro, bem dentro) do que Seguro.

 

Neste ano e meio de governo PSD/CDS muito foi feito. Externamente somam-se elogios. Internamente pairam as dúvidas. A crise em Espanha é bem mais profunda do que se pensa. Os nacionalismos (Basco, Catalão e Galego) podem fazer implodir o nosso vizinho. O caminho que hollande está a trilhar em França é um prenúncio de desastre. E as eleições na Alemanha tardam...Numa Europa adiada é caso para concluir que nada ajuda. Nada. Fica a coragem de Pedro Passos Coelho.

 

Por estes dias, só espero que a teimosia fiscal de Gaspar não deite tudo a perder...

 

De novo o reconhecimento internacional do sacrifício dos Portugueses

jfd, 19.07.12

A centralidade e autoridade de que Vítor Gaspar dispõe no Governo português e o “mantra neoliberal” que consistentemente é entoado pelo primeiro-ministro são ensinamentos que Espanha devia retirar do vizinho mais pequeno, que já leva um ano de intervenção externa.

A conclusão é da Reuters, que ontem divulgou um longo texto de análise intitulado “Líder de Espanha podia aprender algumas lições de Portugal”, depois de constatar que nem a promessa europeia de ajuda à banca, nem o novo pacote de austeridade, deram alento aos investidores, que continuam a cobrar prémios de risco crescentes para financiar o Estado espanhol. (...)

 

Mais uma notícia para ser comentada com desdém por quem não respeita o que nós portugueses estamos a passar e o que se está a fazer pelo futuro.

Vamos aguardar pela ruptura dos pensos rápidos franceses e pela queda das promessas populistas, para depois também os podermos chamar de fascistas.

Ó pobre e retórica esquerda, onde te esconderás? Como te justificarás?

Nunca, de facto, foi tão pertinente dizer que os cães ladram...

A França, sempre a França

Fernando Moreira de Sá, 12.06.12

É por estas e por outras que adoro a França. O mundo pode estar a acabar, a crise financeira a arrebentar e a França preocupada com....:

A notícia caiu como uma bomba em França. Nas legislativas, Ségolène Royal é apoiada pelo Presidente François Hollande e ex-companheiro; mas a primeira-dama Valérie Trierweiler, que não gosta dela, decidiu apoiar o seu rival.
(Fonte: Expresso)

O Rato em Paris?

jfd, 16.05.12
Le Portugal face au quotidien de l'austérité

LE MONDE

Restriction drastique des remboursements de médicaments, doublement du tarif des tickets modérateurs, difficulté d'accès aux centres hospitaliers : au Portugal, le secteur de la santé est en première ligne des restrictions budgétaires imposées en 2011 pour faire face à la crise. Le principe, inscrit dans la Constitution, du droit à la santé gratuite est désormais mis à mal. Autre exemple d'un secteur sacrifié sur l'autel de l'économie : la culture, et en particulier le cinéma. Les caisses sont vides ; aucun nouveau projet n'est soutenu. "Le cinéma portugais risque de s'effondrer", s'alarme le réalisateur Manoel de Oliveira

 (...) 

O início da era Hollande (2)

Pedro Correia, 15.05.12

 

«Como é que alguém consegue governar um país que tem duzentas e quarenta seis variedades de queijo?»

Charles de Gaulle

 

Dados macro-económicos da França que François Hollande herda de Nicolas Sarkozy:

- crescimento médio do PIB entre 2009 e 2011: 1,5%

- crescimento do PIB em 2012 (previsão): entre 0,4% e 0,7%

- desemprego: 10,1%

- défice público: 5,2% do PIB

- dívida pública: 83% do PIB

 

Promessas eleitorais de Hollande:

- renegociação do tratado orçamental

- redução em 30% dos salários do Presidente e dos ministros

- equilíbrio orçamental em 2017 (défice zero)

- introdução na Constituição do princípio da concertação social

- concessão do direito de voto aos cidadãos estrangeiros provenientes de países extra-comunitários

- actualização do salário mínimo, indexado ao crescimento do PIB

- criação de 150 mil empregos para jovens: "contratos de geração"

- incentivos fiscais às empresas que contratem pessoas com menos de 30 anos e mantenham nos seus quadros pessoas com mais de 55 anos

- criação de 60 mil postos de trabalho no sector da educação público da educação e cinco mil na justiça durante os próximos cinco anos

- diminuição da idade de reforma para 60 anos quando houver 41,5 anos de descontos

- reforma fiscal: novo escalão de 45% para rendimentos acima de 150 mil euros e de 75% sobre os rendimentos superiores a um milhão de euros por ano

- taxa de IRC de 35% para grandes empresas, 30% para as médias e 15% para as pequenas

- renegociação dos acordos com Bélgica, Suíça e Luxemburgo que permitam cobrar impostos aos exilados fiscais

- reforma bancária, criando um banco público de investimento separado da banca comercial

- maior regulação do sistema bancário

- proibição de envolvimento da banca francesa em paraísos fiscais

- aumento de 15% do imposto sobre os lucros bancários

- congelamento durante três meses dos preços dos combustíveis e do gás

- redução da componente nuclear da produção de energia eléctrica dos actuais 75% para 50%

- manutenção do Estado nos sectores postal, dos transportes e da energia

- redução do preço dos medicamentos e maior comparticipação de genéricos

- redução para metade da taxa do insucesso escolar

- casamento entre pessoas do mesmo sexo, com reconhecimento do direito à adopção

 

Fica o registo. Para dentro de um prazo razoável verificarmos quantas destas promessas foram cumpridas - e em que termos. Cada vez mais os políticos devem ser confrontados entre o que propõem aos eleitores e aquilo que são capazes de concretizar assim que ascendem ao poder.

Publicado também aqui

O início da era Hollande (1)

Pedro Correia, 14.05.12

 

Vinte e quatro anos depois, a França - o país da Europa que pensa mais à esquerda e vota mais à direita - voltou a eleger um presidente socialista. François Hollande derrotou um desgastado Nicolas Sarkozy por escassos três pontos percentuais, inferiores ao que prediziam todas as sondagens.

Sarkozy, que pela sua natureza e pelas suas atitudes tem pouco a ver com os conservadores clássicos, repetiu até à exaustão durante a campanha que durante o seu mandato de cinco anos nunca a França esteve um trimestre em recessão, apesar da crise generalizada na Europa. É verdade. Mas também é certo que o país tem um nível de desemprego preocupante e as taxas oficiais de crescimento não revelam - longe disso - uma economia dinâmica, o que ajuda a dar asas ao discurso demagógico e populista de Marine Le Pen, a dirigente da Frente Nacional que ambiciona liderar a direita francesa.

 

No digno discurso em que reconheceu a derrota, na noite de 6 de Maio, Sarkozy destacou a força das instituições democráticas que permitem uma alternância tranquila no poder. A vitória de Hollande projecta-se para fora das fronteiras da Europa com a força de um símbolo numa região do mundo onde a esquerda tem sido duramente penalizada nas urnas desde que eclodiu a crise dos mercados financeiros.

Para um democrata, nunca é de mais sublinhar a importância destas rotações de poder ditadas pela soberania do voto popular. Num continente onde crescem de modo alarmante as forças extremistas "anti-sistémicas", indiferentes às lições da História bem evidenciadas nas décadas de 20 e 30 do século passado, um democrata convicto tem o dever cívico de proclamar esta sua condição. Que implica a aceitação dos resultados eleitorais, sejam eles quais forem. O exercício do direito de voto torna as sociedades mais fortes contra as investidas de todos quantos pretendem suprimi-lo invocando para esse efeito palavras tão apelativas e tão manipuláveis como povo, pátria, nação ou classe.

 

A economia francesa não está bem. Mas a política mantém-se de boa saúde e recomenda-se. Prova disso foi a grande afluência eleitoral: mais de 80% dos franceses inscritos nos cadernos de recenseamento acorreram às assembleias de voto na segunda volta das presidenciais.

Uma boa notícia para a União Europeia, que está tão carente delas. E uma responsabilidade acrescida para o novo inquilino do Eliseu, que amanhã toma posse. O seu primeiro passo como Presidente é significativo: voa de imediato para Berlim, onde será recebido por Angela Merkel.

A política vive muito de símbolos. Este é tão forte que fala por si. De forma mais expressiva do que todas as torrentes de retórica em que a França sempre foi fértil. Como costumava dizer o general De Gaulle, "nada grandioso será alguma vez conseguido sem grandes homens - e os homens só se engrandecem quando estão determinados nisso".

Também publicado aqui

Já quase nada se passa "lá fora"...

Francisca Almeida, 11.05.12

O mundo, tal qual o conhecíamos, mudou. O advento desta crise económica e financeira a par da incapacidade dos Estados e dos chamados “poderes instituídos” para compreenderem as suas causas e lidarem com as suas consequências, puseram a nu as alterações estruturais na ordem mundial e na dimensão histórica das relações internacionais. A globalização trouxe consigo uma certa ideia de enfraquecimento do poder estadual, do poder hegemónico do estado sobre o seu território e o seu povo. Paulo Rangel (Estado do Estado, Dom Quixote, 2009) fala numa “ordem política pautada pela fragmentação do poder, pela sua descolagem do Estado e por uma desvinculação da base territorial”.

Uma diferenciação que recorda “o mundo político medieval, a sua estrutural diversidade e a sua condição radicalmente interdependente”. Não se cura, todavia, do meu ponto de vista, de uma nova idade média na visão caótica de Alain Minc (A Nova Idade Média, Difel, 1994) mas antes, como sublinha Paulo Rangel, de um novo equilíbrio, de uma “multiplicidade avassaladora de poderes […] que tendem para um equilíbrio espontâneo, natural e dinâmico em constante mudança e modificação”.

 

Do ponto de um Estado como o nosso - uma pequena economia europeia, aberta, exposta às vantagens e às desvantagens da globalização e, para mais, sujeita à intervenção externa do FMI e das instituições europeias, não há como não esbarrar a cada passo com essa realidade da pulverização dos poderes estaduais por diversas organizações do espaço internacional, de índole diversa e, ainda que indirectamente, por outros estados soberanos, tal é a interdependência entre os vários actores internacionais.

Vem isto a propósito da forma como, este fim-de-semana, seguimos de perto as eleições gregas e francesas. Não por acaso. A periclitante situação grega, a crescente influência das franjas extremistas à esquerda e à direita e a patente incapacidade dos partidos do arco do poder formarem governo – para mais num cenário de minoria parlamentar – faz temer pelo equilíbrio delicado da Grécia no espaço europeu. E, como na teoria do caos, o bater de asas de uma borboleta em Atenas pode bem provocar um segundo terramoto em Lisboa e, já agora, em Madrid e em Roma. Desengane-se quem julga que – à semelhança da Bélgica – a Grécia pode aguentar-se uns tempos sem governo. Se alguma vez deixou de o ser, a Grécia volta a ser a principal preocupação da Europa. E é, não vale a pena escamoteá-lo, uma preocupação séria para Portugal.

 

Por outro lado, a chegada de François Hollande ao Eliseu virá, com elevada probabilidade, evidenciar a inexequibilidade de muitas daquelas que foram as suas bandeiras eleitorais e com isso esmorecer a euforia do Partido Socialista português e de históricos como Mário Soares que clamam agora um “rompimento com a troika”.

Não se julgue, porém, que a Europa sairá da lógica de directório que Cavaco Silva abundantemente critica, porquanto a actual crise europeia não encontra enquadramento adequado nos tratados nem na orgânica das próprias instituições. Contudo, a vitória de Hollande poderá dar um impulso decisivo numa agenda de crescimento que vinha já a desenhar-se mas que, encontra assim, novo pretexto.

Algures na forma como a Europa for capaz de desembaraçar o nó grego e compatibilizar o socialismo europeu com a direita alemã se desenhará também o futuro português. Numa clara demonstração do impacto decisivo que podem ter “cá dentro” acontecimentos que antes só aconteciam “lá fora”.

 

(artigo publicado no Jornal Notícias de Guimarães)