Ninguém, nesta história da austeridade versus crescimento, é inteiramente honesto.
A austeridade diminui o consumo e a diminuição do consumo diminui o PIB e as receitas fiscais, mesmo que com agravamento da carga fiscal nominal.
Diminuindo as receitas fiscais, a dívida pública percentual aumenta, tornando-se insuficientes os cortes na despesa pública; novos cortes, por sua vez, diminuem o consumo, que diminui etc. etc.
Toda a gente entende isto. E face ao espectáculo deprimente da Grécia que se afunda a cada mês, com "apoios" e cortes que alimentam esta máquina infernal, boa parte dos apoiantes do Governo (este escriba incluído) tem este pesadelo por trás das declarações convictas da justeza do nosso caminho.
Esta a primeira desonestidade: fingimos que não temos dúvidas.
No reajustamento em curso, muitos dos apoiantes do Governo (este escriba incluído) dizem para si que, mesmo que a estratégia não resulte, a reforma do Estado ficará sempre como adquirida, sendo ela necessária, como é, qualquer que seja a solução. Mas isto não é claramente assumido - e esta é a segunda desonestidade.
A esquerda comunista (incluindo a menchevique que o BE julga não ser) esfrega as mãos: nos tempos negros da miséria e depressão pode nascer a flor da Revolução no entulho. Essa flor nunca nasceu, nem pode, num ambiente económico estável e sob um regime democrático.
A receita do "não pagamos" (Islândia nihil obstat, os nossos bancos endividaram-se para além do razoável com crédito ao Estado, à habitação e ao consumo, não principalmente com especulação) não é uma alternativa inteligente para a gestão do capitalismo, é a criação de condições permanentes de autarcia económica nas quais soluções autoritárias e radicais anti-capitalistas poderiam ver a luz do dia. Mas isto os Jerónimos e Louçãs não dizem: queremos melhorar a UE, a economia e o sistema capitalista a pontos de, quando estiverem perfeitos, terem desaparecido. E esta é a terceira desonestidade.
A esquerda social-democrata não ousa renegar o MoU, mas finge acreditar (ou, nos casos mais graves, acredita mesmo) que é possível cumprir o Programa que assinou e ao mesmo tempo garantir um módico de crescimento, via despesa pública. E esta é a quarta desonestidade. A mais patética, de tão transparente, mas nem sempre o ridículo tira votos.
Não tenho nem terei responsabilidades políticas, a opinião dos meus concidadãos não condiciona a minha, o que escrevo não atrasa nem adianta a vida de ninguém, se estiver enganado não é a primeira vez, mas honesto gosto de ser: e por isso não escondo que acho que, sem o fim do Euro, pelo menos para os países do Sul, nada se resolverá de permanente.
Chamem-me, se quiserem, o Bruxo de Fafe.