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Forte Apache

Recebido por mail:

Fernando Moreira de Sá, 30.06.12

O Presidente dos EUA era Jimmy Carter, Leonid Brejnev reinava na USSR e o Presidente português chamava-se Ramalho Eanes. Este cavalheiro, "sindicalista" profissional desde 1979, liderou a "manifestação popular" contra o Ministro da Economia na Covilhã. Não faz outra coisa desde 1979...

 

Ficam as minhas dúvidas: os sindicatos demoram assim tanto a renovar os agitadores? Será que exerce alguma profissão desde os idos de 79? Os sindicatos estão tão mal que precisam de manter sempre os mesmos desde os anos 70? É que ser sindicalista não é uma profissão. É, isso sim, um serviço prestado temporariamente em prol dos trabalhadores, algo muito nobre e não uma espécie de "liderança dos ultras" de uma qualquer claque de futebol. 

 

 

A lição de um conservador

Alexandre Guerra, 29.06.12

John G. Roberts/Foto AP

 

John G. Roberts, o presidente do Supremo Tribunal dos Estados Unidos, nomeado para aquele cargo pelo ex-Presidente George W. Bush, e tido como um homem conservador, deu uma lição muito importante de justiça e de equidade ao viabilizar constitucionalmente a polémica lei da saúde de Barack Obama. 

Num Supremo literalmente dividido entre correntes progressista e conservadora, muitos esperavam que Roberts fosse agir em consonância com o seu enquadramento ideológico.

No final de Março, o autor destas linhas escrevia o seguinte sobre esta questão: "Actualmente, o Supremo é composto por quatro juízes mais liberais, e que já deram a entender que apoiam a medida, e por outros tantos de pendor mais conservador, que já manifestaram o seu descontentamento por alguns aspectos constitucionais da lei. Perante este cenário de empate, é muito provável que seja o presidente do Supremo Tribunal, John G. Roberts, a decidir o futuro da importante lei de Obama.  Para já, as indicações dadas por Roberts não são animadoras para a Casa Branca." 

E, efectivamente, com a votação empatada a 4 votos para cada lado, acabou por ser Roberts a decidir o lado vitorioso. Aquele que, certamente, os conservadores não esperariam. A este propósito o site Politico escrevia o seguinte: "By voting to uphold President Barack Obama’s health care law, Roberts shocked conservatives who thought they could rely on him to help sink Obama’s signature legislative accomplishment."

Apesar da sua aprovação, Roberts não deixou de ter sentido crítico ao identificar algumas fragilidades da lei. Mas como o próprio disse: “As between two possible interpretations of a statute, by one of which it would be unconstitutional and by the other valid, our plain duty is to adopt that which will save the act.”

Roberts considerou a "Obamacare" uma lei "boa o suficiente". E às vezes é disso que as sociedades precisam. Não de leis perfeitas e de aplicação duvidosa, mas de leis que sejam boas o suficiente de forma a melhorarem a vida dos seus cidadãos. Roberts percebeu isso. 

A mala de cartão com diplomas

José Meireles Graça, 29.06.12

Sempre ouvi dizer que o segredo para o sucesso da economia é a educação. Formam-se engenheiros, técnicos, cientistas às resmas, dá-se um diploma a toda a gente, de física atómica ou entomologia, e o progresso está logo ali, ao dobrar da esquina. Simples, basta esperar uns vinte aninhos para os benefícios começarem a aparecer, como frutos maduros.

 

Há ou houve alguma vez nos tempos modernos um país que de repente começasse a fugir à mesmice da estagnação, sem um grande esforço na educação? Não há, pois não? Ora aí está.

 

Há mesmo quem defenda que a superioridade chinesa, algo que durou pelo menos até ao Renascimento (parece, por exemplo, que a melhor tecnologia naval da época dos Descobrimentos não era a Espanhola ou Portuguesa ou Italiana, era a Chinesa) se ficou a dever à instituição do mandarinato, que permitia o acesso à classe dirigente não pelo nascimento mas pelo conhecimento.

 

Sucede que os países comunistas sempre acreditaram nesta receita; e, concomitantemente, "apostaram" na educação, com os resultados que se conhecem, não obstante um modesto triunfo, mais propagandístico que real, aqui e além. E nós, que temos "a geração mais bem preparada de sempre", no dizer pacífico e orgulhoso de quem nisso acredita, temos também a abjecta situação a que nos trouxe, entre muitas outras coisas, o despejar sem critério de milhões de dinheiro público por cima da educação, mais o empreendedorismo das fábricas privadas de diplomas com a chancela do Estado.

 

Manuel António Pina aponta o dedo premiado, fremente de indignação, a uns quantos privilegiados do regime, e põe-nos a eles de um lado e, do outro, os emigrantes, dos quais "muitos são engenheiros, arquitectos, professores, cientistas, que levam na bagagem conhecimento técnico, doutoramentos, mestrados, licenciaturas, e a frustração por terem nascido num país que os enjeita, castigando-os por terem perdido anos a estudar e qualificar-se ...".

 

O País não os enjeita pelo investimento que fizeram - castiga-os por não ser capaz de criar empregos. E não os criou nem cria por causa do mesmo Estado que acreditou na equação simplista de que mais ensino = mais desenvolvimento. O ensino é condição necessária mas não suficiente - fora preciso, além disso, que não fôssemos governados por gente que como Pina confunde correlações com causalidades e acha por exemplo que mais igualdade = mais desenvolvimento.

 

Pina não entende coisas complicadas - as ideias iracundas de motorista de táxi embrulha-as num português literário escorreito, a ver se ficam mais lúcidas.

 

Não ficam. 

 

Quando a norma equivale ao erro

Pedro Correia, 29.06.12

«Invejo a burrice, porque é eterna.»

Nelson Rodrigues

 

O que dantes era emendado como erro básico de ortografia, próprio de gente burra, agora é mantido solenemente em artigos de jornal por vir com a chancela quase oficial da agência Lusa, primeiro órgão de informação a substituir o português pelo acordês. Os resultados estão à vista: a palavra contacto, que nem o "pacto de submissão" aos interesses das editoras brasileiras previa, é amputada duas vezes no mesmo texto de origem (e felizmente emendada no título do jornal). Na dúvida, opta-se pela burrice à boleia do tal acordo destinado a suprimir consoantes.

Começa-se pelas chamadas "consoantes mudas" e logo se transita para a caça às sonoras, que assim deixam de o ser. Até cada um passar a escrever como lhe der na real gana. Sem norma, com imensas "facultatividades", sem a noção básica da etimologia. Como António Guerreiro sublinha aqui, a propósito de panóptico, palavra que «nunca teve outra pronúncia que não fosse a da 'norma culta'» e que apesar disso passou alarvemente a escrever-se panótico por imposição dos "corretores ortográficos" em acordês.

À falta de um vocabulário ortográfico comum - promessa nunca concretizada pela brigada acordista - passa a valer tudo: erro e norma tornam-se irmãos siameses. «O AO, estúpido como é - de uma estupidez cómico-grotesca -, promove constantemente erros de hipercorrecção, sem fornecer meios que os possam evitar. E, hipertélico, acaba por ir além dos seus próprios fins e anulá-los. Sem o 'p' a palavra refere-se à audição, e não à visão, ou então é utilizada no campo da química para designar um corante», sublinha Guerreiro, crítico literário do Expresso.

Sábio - nesta matéria, como em tantas outras - era Fernando Pessoa. Que escreveu, cheio de razão: «A ortografia é um fenómeno da cultura, e portanto um fenómeno espiritual. O Estado nada tem com o espírito. O Estado não tem direito a compelir-me, em matéria estranha ao Estado, a escrever numa ortografia que repugno, como não tem direito a impor-me uma religião que não aceito.»

Sobretudo quando procura impor uma norma que equivale ao erro.

Publicado também aqui

O bom exemplo do NOSSO JARDIM

Miguel Félix António, 29.06.12

Uma dúzia de anos é muito tempo na vida activa de uma pessoa, ainda que passe bastante rápido principalmente quando estamos entre os 40 e os 50…

 

Nos últimos 12 anos foi intenso e tranquilo, o nosso relacionamento, meu e da Teresa, com o externato O Nosso Jardim, fechando-se em 2012 um ciclo que, coincidindo com a saída deste colégio dos nossos 2 filhos mais novos, me incutiu marcas profundas e me começa já a deixar uma grande saudade. Além do mais, entre os pais dos amigos dos nossos filhos, fizemos também excelentes amigos, o que é cada vez mais difícil, principalmente à medida que a idade avança, o que pode ajudar igualmente a compreender a dimensão da cumplicidade e do envolvimento que subjaz ao projecto educativo.

 

Criado em Lisboa, em 1957, por Maria Ulrich, O Nosso Jardim nasceu como centro de investigação pedagógica da Escola de Educadoras de Infância, também por si criada em 1954, com um grupo de 12 crianças dos 3 aos 6 anos de idades misturadas entre si. Foi o local privilegiado para pôr em prática os seus ideais de educação. Segundo reza a história, as alunas e as professoras da Escola logo lhe chamaram O Nosso Jardim (de Infância), assim ficando a ser conhecido.

 

Conforme vi escrito algures e subscrevo, Maria Ulrich inaugurou muito mais do que o espaço de uma escola, criou um conceito de educação que consiste em acompanhar e orientar cada uma das crianças conforme o seu talento, como se fosse única no meio de outras. Por isso apostou em grupos pequenos e num ambiente acolhedor, familiar e espiritual.

 

Eu posso testemunhar por experiência própria o excelente ambiente proporcionado às crianças, dotando-as de autonomia, estimulando a sua criatividade, abrindo-as ao mundo que as rodeia, mas fomentando sempre o seu sentido de responsabilidade. Sem descurar a disciplina, que deve ser aprendida e interiorizada desde muito pequeno, as professoras e as auxiliares de educação, todos os colaboradores da escola, os ajudaram a crescer e a serem eles próprios, limando aspectos menos positivos que tantos podemos ter propensão para desenvolver.

 

Dispensando carinho, atenção e uma dedicação inexcedíveis para com as crianças numa idade em que tudo isto é preciso em doses adequadas, souberam combinar de forma magistral os ingredientes que devem fazer parte deste período formativo. Provavelmente, com a sua actuação, estes educadores permitiram inclusivamente um excesso de despreocupação, que assumo, a partir do momento em que manhã cedo, eu ou a Teresa (é certo que mais ela do que eu…), os deixávamos franquear as portas do colégio. Para onde iam com um entusiasmo e uma alegria comoventes, deixando-nos a nós, pais, completamente municiados, com uma energia suplementar, para lidar com outros olhos cada dia que se nos deparava.

 

A organização, a previsibilidade, a atenção e a integridade d´O Nosso Jardim devem ser enaltecidos, designadamente, porque entre os 2 e os 9 anos de idade é muito importante o teor da educação que se ministra. Principalmente num tempo em que tudo parece ser negro e sem saídas, em que todos os valores que julgávamos imutáveis (porque acredito que por muito que haja mudanças, há princípios que não são transaccionáveis), se apresentam com facilidade como possíveis de transfigurar, O Nosso Jardim foi, e estou certo assim continuará a ser, um esteio do que de bom existe no nosso país.

 

Porque, embora tal não possa parecer, também há coisas boas em Portugal e a vida não são apenas desgraças e maus exemplos como, porventura, se poderá extrair de alguns dos ecos diários dos órgãos de comunicação social. É que ainda há bons modelos, na saúde, na educação, na justiça, nos sectores público e privado.

 

Nem tudo é mau e existem iniciativas como esta que merecem ser apontadas. No ano em que se perfazem 11 lustros sobre a instituição do Nosso Jardim não é de mais salientar a consolidação da educação muito completa que é disponibilizada às crianças que têm o privilégio de o frequentar, entre as quais estiveram os meus 4 filhos.

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