A Europa mudou
De forma subtil, mas mudou. A Cimeira de Bruxelas representa uma grande vitória da chanceler Angela Merkel, que os comentadores portugueses claramente subestimaram nas últimas semanas, em termos duríssimos e obviamente errados. Ao fazer aprovar um pacote de disciplina orçamental sem mudar substancialmente o Tratado de Lisboa, a Alemanha clarificou a situação interna da UE e uniu os europeus numa solução que dá credibilidade à zona euro. O Tratado já tinha os mecanismos suficientes para resolver a questão, nomeadamente a figura da cooperação reforçada, mas não foi necessário recorrer formalmente a esta regra, pois há 26 países num dos lados e apenas um do outro.
Os resultados são complexos e será necessário digerir tudo com atenção, mas julgo ser possível fazer alguns comentários:
Este é apenas o primeiro passo de um processo que durará anos. Mas, sublinho, em Portugal foram poucos os que compreenderam aquilo que estava a acontecer. A Alemanha lidera a UE e decidiu que não ficava ninguém para trás. Um dos momentos decisivos, curiosamente, foi a negociação com a Polónia, que na prática resultou no isolamento do Reino Unido.
David Cameron está, de facto, numa situação difícil, com o seu governo dividido e o partido conservador a hesitar. Londres fica fora da "união de estabilidade orçamental" e fora do euro, pelo menos até ser negociada uma saída airosa. O facto é que a UE já não é apenas um mercado único, mas deu um passo firme numa direcção mais federal.
A "união de estabilidade orçamental" tem obviamente aspectos criticáveis, mas mudou a natureza da organização. Falta ainda a parte da solidariedade, o fundo permanente, eventualmente eurobonds e mudança de estatutos do banco central, mas os países cederam soberania, o euro poderá sobreviver e, acima de tudo, não houve imposição, mas negociação intergovernamental.
A má notícia desta cimeira é a exclusão do Reino Unido, o que terá repercussões em outras ambições da União. Mas não é caso encerrado.
Portugal teve um excelente resultado nesta cimeira, pois conseguiu o que queria, ficar dentro da zona euro, sendo agora bem evidente que se continuar a mostrar determinação em pagar as dívidas terá a compreensão dos aliados. O PS parece andar aos papéis e os pedidos de referendo são, no mínimo, absurdos.