O cinturão de bombas fortemente retóricas
A gente põe o fato e as garrafas, por causa da profundidade, e amarra uma corda à cintura, por causa do "pensamento torrencial", e deixa-se ir. Porém, é preciso primeiro responder a perguntas sibilinas e insinuações subtis. Exemplos:
A poesia não é uma forma de religião. Não é uma negação da realidade?
Nas suas crónicas fala repetidamente da expulsão dos poetas da polis e opõe os economistas aos poetas. O que significa isso?
É possível fazer poesia nos tempos da troika?
Manuel António Pina opõe o poeta ao economista, mas também a infância à idade adulta, em que a infância aparece como um sítio, quase um paraíso perdido...
Mas isso remete para a questão clássica da filosofia, perante essa espécie de morte de Deus na imensidão do cosmos: porque raio de razão faremos nós o que quer que seja?
O resto afina por este diapasão e Manuel António Pina está à altura, de uma forma só acessível talvez a José Pacheco Pereira, num dia de inspiração. Mas, apesar da sua brilhante performance, conclui desalentado que “a vontade que tenho era pôr um cinturão de bombas e rebentar com essa malta toda”.
Não me parece mal a ideia do cinturão de bombas - desde que poupe a malta.