A usura oficialmente virtuosa
É hoje relativamente pacífico que o Euro, enquanto os emprestadores viveram na ilusão de que as dívidas externas dos países que a ele aderiram não tinham importância, permitiu que a economia portuguesa se financiasse, fosse para investimento público, privado ou ainda para consumo, a taxas irrealistas.
Daí os delírios do investimento público não reprodutivo, do endividamento de empresas e famílias, do crescimento baseado no consumo de bens importados e da expansão do Estado Social sem economia que o suportasse.
Todos os problemas que a economia portuguesa enfrenta decorreram de escolhas políticas. E esta verdade triste fica reforçada pelo facto de um demagogo dinâmico, convincente e trafulha como Sócrates, acolitado por um colégio de economistas mentecaptos da lamentável escola Constâncio, ter beneficiado de legitimidade democrática reiterada.
É assim - o Povo pouco entende de economia, nem se espera que entenda, e os economistas também não, embora se imagine que sim.
A Deusa Economia, com tempo, acerta todas as contas, indiferente aos sacerdotes que, em nome dela, têm êxtases e visões. E que muitos fiéis sejam triturados no processo está na ordem natural das coisas.
Estamos nessa fase - do acerto e da trituração: afinal consumir não é boa ideia, importar ainda menos, e a palavra de ordem é pagar os calotes dê por onde der.
Mas isto é o País e os malditos diabos estrangeiros. Entre nós, e com os burocratas e plutocratas locais, conviria que os penitentes (porque votaram escolhendo miragens) não fossem ademais vítimas de uma banca incrivelmente cúpida, estúpida e mal gerida, com a chancela e a conivência do organismo público cuja missão é, entre outras, a de evitar abusos.
É que os dicionários definem usura ou agiotagem como o delito cometido por quem empresta dinheiro, cobrando taxa excessiva de juros. E não há outra maneira de classificar isto: Cartões de Crédito, Linhas de Crédito, Contas Correntes Bancárias e Facilidades de Descoberto - 36,5%.
Estas taxas são mafiosas. E não deixam de o ser se defendidas por sábias explicações académicas, fatos de riscas, vozes graves e prestígio de pacotilha.
Que a nomenclatura europeia, com a característica estupidez das burocracias privilegiadas, sofra de cegueira contumaz e crie as condições para a sua própria extinção, a prazo, é da ordem das inevitabilidades e, para mim, uma feliz perspectiva; que entre nós e connosco, o roubo seja coonestado por quem tem obrigação de o prevenir releva do domínio do incompreensível.
Ou talvez não.