Tobacco Road II
Gostaria de esquecer este Savonarola da Saúde. Mas o homem não deixa: quer ir ao meu café remover a máquina de tabaco, a fim de me obrigar a ir sabe Deus onde, e proibir-me de fumar onde o faço habitualmente; quer ir dentro do meu carro meter o nariz e, se não for travado, quererá ir dentro de minha casa fiscalizar-me os hábitos (porque - não é verdade? - se pode invadir a propriedade privada móvel também pode invadir a imóvel); invoca estudos delirantes (“Está demonstrado que a concentração de fumo na parte de trás do veículo é muito grande, além de que os plásticos ficam embebidos por material carcinogénico que vai sendo lentamente libertado"), nos quais com toda a probabilidade é bem capaz de acreditar; e de uma maneira geral julga que tem uma missão salvadora das crianças e redentora da saúde e da moralidade públicas - os Savonarolas sabem sempre melhor do que as pessoas o que a elas convém.
É um ser perigoso. E, é claro, tem a companhia de outro metediço, ainda com menos legitimidade do que o governante português, que está "profundamente preocupado pelo facto de a maioria dos europeus começar a fumar na adolescência, antes de completarem os 18 anos”, situação que vai corrigir a golpes de regulamentos, multas, proibições, raios e coriscos.
Já agora me obrigam a agir fora da Lei, jogando ao gato e ao rato com as circunstâncias: infrinjo sem hesitações a Lei actual e não hesitarei em infringir as novas - a leis iníquas não é devida obediência.
E iníquas são elas: o senhor Secretário do Estado ao qual quer que cheguemos não tem o direito de me proibir comportamentos lesivos da minha saúde; a defesa de direitos de terceiros foi há muito ultrapassada, e não é agora mais do que uma desculpa frágil e hipócrita para um combate puritano.
O apoio maioritário de que estas medidas gozam significa nada: apontar o dedo a uma minoria que é diferente e, no caso, diferente por ter um vício, foi sempre um expediente de sucesso garantido para governantes a querer mostrar com proibições o serviço que não mostram com acções.
Sabe que mais, Nandinho? Vá trabalhar, a ver se produz algum bem.