Mais democracia, mais cidadania
Todos vimos em directo, nos canais de televisão. António Ramalho Eanes - talvez o político mais impoluto que conheci até hoje em Portugal -, João Lobo Antunes, Manuel Alegre, Mário Soares, Bagão Félix, Leonor Beleza, Jorge Sampaio, Vítor Bento e todos os outros conselheiros de Estado foram insultados e vaiados, à chegada e à saída ao Palácio de Belém, por uma multidão que lhes chamava "chulos" e "gatunos".
"Quis ver os desavergonhados que se estão a aproveitar do nosso país", dizia uma senhora entrevistada por uma equipa de reportagem televisiva, enquanto um cavalheiro também presente na vigília da praça Afonso de Albuquerque berrava: "A democracia tem que acabar."
Uma coisa são as críticas - duras, indignadas, veementes - ao Governo. Outra é arrasar por igual todos os políticos, defender o fim das instituições democráticas e menosprezar os mecanismos constitucionais. Confundir tudo numa amálgama de impropérios onde só falta pedir um "pulso forte" para "endireitar o País" é meio caminho andado para desembocarmos numa situação muito pior do que a actual.
Os protestos de rua são inteiramente legítimos. Mas a rua não substitui o voto, por mais genuína que seja a indignação colectiva. E a insensatez dos insultos aos conselheiros de Estado está nos antípodas da cidadania. Ao contrário do que gritava o tal cavalheiro, a democracia não deve acabar. Deve melhorar, isso sim. E ser aprofundada. Sempre com mais cidadania, nunca com menos.
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