O Minho é uma passagem para a outra margem
Hoje, na Universidade de Vigo, explicava a um dos meus professores que um dos meus amigos e parceiro me denominava, enquanto perigoso regionalista nortenho, habitante da Galiza Sul. Ao que ripostou, com sonora gargalhada tão típica de galego, que ele se sentia um português do Norte.
Nem todos percebem esta relação verdadeiramente especial entre nós, as gentes do Norte de Portugal e as gentes da Galiza, sobretudo do Sul da Galiza – Tui, Vigo, Ourense, Pontevedra e mesmo, independentemente das rivalidades com Braga, Santiago de Compostela.
O Minho sempre foi uma ponte entre estes dois territórios, nunca uma fronteira ou um separador. As margens do Minho ou os montes que unem as duas regiões sempre foram pontos de passagem. Mais recentemente, no século XX, serviram de refúgio da Guerra Civil de Espanha ou de fuga/regresso, conforme as perspectivas políticas, nos primeiros tempos da nossa democracia.
Quando, por força da integração europeia, se aboliram as fronteiras mais nítida se tornou esta realidade. Quando se entra na Galiza torna-se difícil perceber que já não se está no Minho ou em Trás-os-Montes. Pelo menos para nós, aqui no Norte. A língua é praticamente a mesma (o velhinho galaico-português). Como ainda hoje me contava com piada um outro professor, quando vai a Lisboa confundem-no com um portuense ou minhoto ou transmontano por via da pronúncia. Expliquei-lhe que me acontece muito confundirem-me com galego em Madrid e Barcelona.
Um fenómeno muito interessante que se acentua na Galiza nas últimas décadas, sobretudo no meio académico e intelectual galego, é o seu profundo conhecimento sobre a nossa cultura – os nossos escritores, os nossos músicos, os nossos costumes. Infelizmente, nestas mesmas últimas décadas, o inverso não é tão verdadeiro, bem pelo contrário. O crescimento da aprendizagem da língua portuguesa na Galiza, até como forma de expressão política de determinados sectores da sociedade galega, é uma realidade indesmentível. Nos diferentes estudos de mestrado e doutoramento de universidades como a de Vigo e de Santiago, é possível a um estudante português apresentar as suas provas na sua língua materna. Sinceramente, desconheço se o inverso é verdadeiro nas nossas universidades. No meio académico galego o respeito pela língua portuguesa é extraordinário e deveria envergonhar muitos académicos nacionais que teimam em privilegiar o inglês em detrimento da nossa língua.
É, também, por isso que na Galiza me sinto em casa. Cada vez mais. Mesmo não sendo um “galego do Sul” nem eles “portugueses do Norte”. Não. Isso seria redutor. O que nos une é bem mais profundo...