A pan-greve
Os Portugueses, na hora de votar, não se afastam do Centrão - nunca se afastaram do Centrão. E o que as sondagens mostram, mais uma vez, é que, se houvesse eleições agora, trocavam este governo, que não está a fazer o que disse que faria, por um governo do PS, que não faria aquilo que diz.
Cada qual é livre de interpretar a alma popular como entende. Por mim, acho que o Povo sabe perfeitamente que está a ser aldrabado, e conta com isso. O PCP, o MRPP, até mesmo o BE, tendem a ser perfeitamente coerentes - mas não vão além de 15%. Talvez chegassem aos 20%, se o eleitorado decidisse dar um murro na mesa, e a esquerda da rua veria a Revolução logo ali ao dobrar da esquina. Mas a esquerda da rua vê sempre a Revolução já a seguir, logo que a burguesia acabe de se enforcar com a corda das suas contradições.
Por ora, estamos em suspenso: o PS não quer a batata quente do Governo, Seguro espera que a "Europa" resolva o problema de alguma forma para ele ser herdeiro de um Poder perfeitamente balizado, e o Governo espera que algures no futuro se desate o nó desta situação impossível, ou se encontre um equilíbrio que não sabe bem onde está. Na sombra, vários putativos salvadores da Pátria, como o edil Costa ou o agora discreto Assis, ou ainda o filósofo Carrilho, esperam - Seguro está só a segurar o lugar para ele não arrefecer.
Todos eles contam com a "Europa", desde que esta infeliz deusa se dê ao trabalho de seguir o caminho que melhor lhes serve os interesses, coisa que para já está muito relutante em fazer.
É neste pano de fundo que se inscreve a greve geral europeia. Nas palavras oportunas de Daniel Oliveira: "Nuns casos, a greve serve para, através dos prejuízos que causa ao empregador, obrigá-lo a recuar numa imposição que se considera abusiva. Essas greves devem ser feitas antes das decisões estarem tomadas e por tempo suficiente para que o prejuízo seja tal que obrigue a uma negociação ou a um recuo. Outras greves são uma forma de manifestar uma posição. É o que geralmente acontece com as greves gerais."
Mais claro não se pode ser: "manifestar uma posição". A posição da esquerda dos países aflitos, e que é esta: quereis uma moeda única? Nós também. Mas isso cria desequilíbrios permanentes, e nós queremos governar com défices, por isso fazem favor de transferir caroço.
Fiz greve uma vez na vida: quando me recusei a contribuir com um dia de trabalho para a Nação. Mas se esta fantasia de agora tivesse a mais remota hipótese de sucesso, VV. Exªs teriam aqui um grevista de primeira apanha. Até seria capaz de ir de braço dado com um moço com aspecto de fedayeen e dizer-lhe, comovido: se isto não é povo, onde é que está o povo, pá?