Na sua coluna no Expresso do fim de semana passado, em artigo fremente de indignação, Miguel Sousa Tavares amarra ao pelourinho da opinião pública Sócrates, Teixeira dos Santos, Alberto João Jardim, Durão Barroso e restantes dirigentes da UE ("os grandes senhores da Europa entregues à sua irrecuperável estupidez"), Merkel, a Troika, António Borges, os grandes escritórios de advogados e o Governo actual — espero ter listado tudo. Relvas, desta vez, escapou, como escaparam Alexandre Soares dos Santos, António José Seguro e o Monstro das Bolachas, sem dúvida por ter acabado o espaço disponível.
MST queixa-se, em resumo, dos desmandos socialistas que nos trouxeram até aqui; da União Europeia que não lidou com a situação da melhor maneira; e da receita austeritária, tanto europeia quanto nacional: "...como é que um pequeno país, como Portugal, experimentou uma receita jamais vista — a de tentar salvar as finanças públicas através da ruína da economia".
Quem descreve problemas em artigos de opinião não tem obrigação de fornecer soluções — um bom diagnóstico já é suficientemente raro para merecer encómios. Mas MST oferece algumas soluções — já lá vamos.
Ocorre que MST é socialista. E proponho que mesmo que Sócrates não fosse, como provavelmente é, venal; mesmo que os contratos das PPPs tivessem sido redigidos de forma equilibrada e não por advogados espertos e políticos estúpidos ou desonestos; ainda que não se tivesse feita obra pública que agora escandaliza pelo esbanjamento e a desnecessidade; se não tivesse sido nacionalizado o BPN; e se os erros cometidos não o tivessem sido por tantos incompetentes, mas sim por muitos mais inocentes - o resultado não teria sido muito diferente.
É que o equilíbrio das contas do Estado nunca foi, depois do 25 de Abril, nada que o establishment respeitasse. E não é, mesmo agora, nada que a Esquerda aprecie. E assim, o dizer que o mal não está na despesa excessiva mas sim nesta despesa excessiva é o que se diz sempre que o resultado é o desastre: Ah, que se estes incontáveis biliões tivessem sido gastos em educação, e em saúde, e em formação profissional, e na Cultura, e fossem administrados por gente séria, que diferente seria!
Não seria diferente — seria muito parecido. A menos que tivéssemos moeda própria, caso em que o valor dela reflectiria pela desvalorização os delírios dirigistas e intervencionistas dos governantes que temos escolhido, servindo de aviso e, em parte, de correcção.
MST não vê isto. E imagina que com outro pessoal (quem? Seguro pelos vistos não serve) há alternativa à austeridade.
Não tivemos direito a uma ideia-força do que poderia ser este programa alternativo, mas a algumas ideias parciais: i) O programa de renegociação das PPPs não está mal, embora pareça ignorar a contemplação dos interesses estrangeiros que estão presentes e cuja ofensa poderia ser um tiro nos pés; ii) Obrigar "os bancos a aplicarem todo o dinheiro que vão buscar ao BCE a 1% de juros no financiamento da economia e das empresas viáveis e não em autocapitalização, para taparem os buracos dos negócios de favor e de influência que andaram a financiar aos grupos amigos", soa muitíssimo bem. Excepto pelo pormenor de os fazer falir, obrigando à sua nacionalização; iii) "Todas as empresas de construção civil, que estão paradas por falta de obras e a despedir às dezenas de milhares, se possam dedicar à recuperação e remodelação do património urbano, público ou privado, pagando 0% de IRC nessas obras". Excelente ideia, embora os privados não estejam a dar sinais de, mesmo com desconto, estarem interessados nas obras que MST estima altamente desejáveis, e o Estado não ter dinheiro para financiar as suas; iv) "Proíbam as privatizações feitas segundo o modelo em moda, que consiste em privatizar a parte das empresas que dá lucro e deixar as 'imparidades' a cargo do Estado." Realmente...eu iria mais longe, não privatizando empresas sem garantias de não estar a criar monopólios privados. Embora, tirando o BPN, uma bota rota e podre que era preciso descalçar, não esteja ao corrente da existência de outra empresa em que o Estado tivesse ficado com as imparidades.
"A próxima vez que o careca, o etíope e o alemão cá vierem, estou disponível para tomar um cafezinho com eles no Ritz. Pago eu, porque não tenho dinheiro para os juros que eles cobram se lhes ficar a dever."
Ora, Miguel, pode confiar, eles sabem que é de boas contas. Mas duvidam que o nosso País também seja. E por isso, 4,5%, com a inflação como está, nem parece um número muito impressionante. Eu a si emprestava-lhe a 2% — ao País nem aos 4,5%.