Ontem Portugal gritou.
Desta vez não foi um silêncio ensurdecedor.
Ontem, no Porto, em Braga, em Vila Real, em Coimbra, em Faro, Portimão, Castelo Branco, Évora, Lisboa e outras mais, os portugueses e as portuguesas desceram ruas e juntaram-se nas suas praças.
Para muitos comentadores e outros tantos desconhecedores da realidade em que Portugal e os portugueses mergulharam, foi uma manifestação contra a troika, o Governo e o Presidente da República. Não foi tão redutor.
Os portugueses foram para a rua pelo desespero em que estão mergulhados. Vidas interrompidas. Os mais velhos por se verem espoliados de parte substancial da sua reforma a que tinham e continuam a ter direito. Os mais jovens por se terem apercebido de que não passou de uma miragem a oportunidade que lhes foi vendida pelo canudo obtido. A geração da minha irmã pela angústia de não saberem que futuro dar aos filhos e como sustentar o dia a dia. As crianças pelo desespero que sentem nos olhares dos seus progenitores. Os pequenos e médios empresários por estarem em pânico perante o esbulho fiscal que lhes retira qualquer esperança de recuperação. A minha geração por não saber, na realidade, se fica ou parte.
Todos estes portugueses, a esmagadora maioria dos portugueses, olha para a realidade quotidiana e ficam mudos de espanto: o ministro das finanças, na sua frieza imperturbável, não acerta numa previsão, num número que seja. Várias vozes o avisaram, publicamente, que quanto mais se sobe os impostos, mais diminuiu a receita. Nada. O resultado está à vista. O completo desastre.
Gaspar faz-me recordar aqueles professores universitários, apelidados de génios deste mundo e do outro que, quando numa sala de aulas, falam para os alunos do alto da sua soberba e os estudantes, atónitos, não percebem palavra do que o homem diz. Metade desiste e a outra metade faz um enorme esforço. No final, a taxa de reprovação é esmagadora e a culpa, obviamente, não é do génio. São os alunos que não se esforçaram por aprender. O problema é que Portugal não é uma cadeira de uma qualquer licenciatura nem os portugueses uma mera turma de universitários.
Ao princípio pensei que o problema do Governo era a comunicação. Hoje, sinceramente e sem meias palavras, percebo o erro. A questão é outra. Temos um Governo, legitimamente eleito pela maioria dos portugueses que expressaram a sua vontade votando no PSD e no CDS, completamente refém de um ministro das finanças e sua “tropa de elite técnica” desfasados da realidade. Não conhecem o país, não conhecem os portugueses e do pouco que não ignoram, detestam profundamente. No fundo, no fundo, nós metemos-lhes asco. Para eles, somos nós que estamos mal, que estamos errados, que somos umas nulidades.
A maioria dos portugueses acreditou em Pedro Passos Coelho. Na suas ideias, na sua forma de estar e na esperança que transmitia. Foi nele que os portugueses votaram. Não foi em nenhum Gaspar. Foi nele que depositámos o nosso futuro. A esmagadora maioria dos portugueses sabia, perfeitamente, quem foram os culpados da situação em que Portugal se encontrava em 2010 e disso deram a devida nota nessas eleições. Os portugueses sabiam, que ninguém se iluda, que a situação que Pedro Passos Coelho iria encontrar seria bem pior do que aquilo que nos fora contado. Sabiam, não façam dos portugueses nem burros nem tolos. Até podem aparentar, fruto de cedo terem aprendido que, em relação a certas espécies, é conveniente alguma dose de manha. A Pedro Passos Coelho só se pedia seriedade e competência. Não era pouco. Era o necessário para salvar os dedos.
Por isso mesmo, a maioria dos portugueses que ontem foi para a rua, fizeram-no como um aviso. Um último aviso. A quem? À troika? Não, essa é menor nesta equação. Ao Governo? Não, esse não conta para este campeonato. Ao Presidente da República? Não, esse, para mal de todos nós, deixou de existir no dia em que se lamentou da sua reforma. Não, a maioria dos portugueses foi para a rua dar um último aviso a quem pode, ainda, resolver: Pedro Passos Coelho.
Os portugueses, a maioria, não quer eleições. Não acredita que Seguro seja solução e teme soluções radicais. Estamos mal, muito mal mas, felizmente, ainda estamos vivos.
Desta vez, foram pacificamente para a rua por ainda lhes restar um mínimo de esperança. A esperança de que Pedro Passos Coelho assuma que é ele o Primeiro-ministro de Portugal, que é ele que comanda a Nação e é dele a responsabilidade primeira. A ele cabe escolher ministros políticos para fazer política e técnicos competentes para auxiliar os políticos a executar as medidas necessárias para recuperar a economia e, com ela, a criação de postos de trabalho, de riqueza. Só dessa forma se pagam dívidas. E só dessa forma, quem nos emprestou volta a ter esperança de receber. O pior para os credores é o incumprimentos ou os perdões de dívida...
Caso contrário está tudo perdido. O Governo irá cair, Portugal mergulhará numa das piores crises políticas e económicas da sua história. Os portugueses não iriam perdoar nem ao PSD nem ao CDS e o castigo nas urnas, já em outubro, seria exemplar. Será o princípio do fim. Sem perdão.