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Forte Apache

Cozinha de autor

José Meireles Graça, 07.06.12

 

Receita para uma tese fortemente apelativa: vai-se buscar estatísticas, factos históricos e tendências que a pareçam ilustrar; não se indicam as fontes e, se forem indicadas, não se vêem os números de muito perto, a fim de evitar explicações alternativas que se afastem da tese; confundem-se correlações com causalidades; junta-se alguma indignação  santimoniosa  (com perdão do barbarismo) - está pronto a servir.


Deixa-me experimentar:


Na década de 60, Portugal cresceu a taxas asiáticas, quase o dobro daquelas a que cresciam os futuros parceiros da CEE e da UE; não havia sindicatos independentes do Governo, nem salário mínimo, nem subsídio de férias, nem 13º mês, nem SNS, a escolaridade obrigatória era de apenas quatro anos, as taxas de escolarização no ensino secundário eram baixas, e baixíssimas no superior. Não havia liberdade de imprensa e os Sérgios Lavos da época estavam ou no estrangeiro, ou na prisão, ou calados.

Logo, como aquelas taxas de crescimento, que não tinham precedentes históricos, não foram, sequer de longe, aproximadas depois do 25 de Abril, nem serão no futuro até onde a imaginação alcança, permitam-me VV. Ex.ªs extrair triunfantemente a implícita conclusão:

O Salazarismo é melhor do que a Democracia.


Não, não extraio esta conclusão, que não faço cozinhados com ingredientes duvidosos. Mas com o que daquelas bandas se sugere para cozinhar os nossos problemas actuais, sei bem o prato que resultaria: o ajiaco cubano.

O Clube dos Poetas de Esquerda Mortos

José Meireles Graça, 28.03.12

"Os saudosistas da escola salazarista são muito especiais: tecem loas ao método tradicional daquele tempo, à memorização matraqueante de datas, nomes de rios..."

 

Li isto com satisfação, julguei que era comigo. Mas não, o inimigo era o Ministro Crato - é sempre a mesma coisa, às pessoas insignificantes como eu ninguém insulta.

 

Realmente acho que o sistema salazarista de educação primária e secundária, se se lhe descontar o nacionalismo estreme, a doutrinação católica forçada, a glorificação do regime e alguma violência e autoritarismo; e se se lhe fizer a necessária actualização científica e alguma correcção curricular (por exemplo, o Francês deixou de ter a importância que tinha ainda há poucas décadas) compara bem com o descalabro abrilista.

Não é que as gerações rascas tenham maiores quantidades de calinos ou sequer de ignorantes; pelo contrário, a massificação do ensino levou a que o número absoluto de alunos com conhecimentos e até brilhantes tivesse crescido - a pool de gente a quem foi ministrado algum conhecimento é muito maior.

Mas isto foi feito, como aconteceu com outros sectores que registaram algum sucesso, sem perguntar se a comunidade podia sustentar indefinidamente despesas crescentes; à boleia da ideia fantasiosa de que o investimento na educação é sempre reprodutivo; e destruindo selvaticamente tudo o que o regime defunto pôs de pé, na crença de que atirar fora a água suja do banho, e o menino com ela, se justificava porque estava tudo infecto.

O Sérgio Lavos, o Professor Santana, inúmeros outros, devem achar que isto é assunto para especialistas, brandindo estatísticas e estudos - certas estatísticas e certos estudos, consoante se está à direita ou à esquerda e se pertence ou não à burocracia pública e a grupos de interesses.

 

A mim basta-me meia dúzia de princípios sãos, e os olhos e ouvidos abertos, para: ver e ouvir professores de história com boas classificações mas incapazes de se localizarem no tempo histórico; professores de Português que escrevem e falam num dialecto tosco da Língua que supostamente ensinam; e guardar um militante cepticismo em relação às teorias pedagógicas do Clube dos Poetas Mortos e modernidades sortidas.

Crato fez e vai fazer muitas asneiras, como outros antes dele. Detalhes, que está no caminho certo - como os outros não estiveram.