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Forte Apache

O que é nacional é bom

Joana Nave, 04.03.13

Há uma mania bem portuguesa de desvalorizar o que é nacional. Este enviesamento começa logo quando achamos que somos um país pequenino, que não temos pessoas capazes de almejar lugares de topo, porque erguemos a bandeira da dor e do sofrimento, em vez de nos focarmos nas características únicas que possuímos e que nos colocam a par dos grandes conquistadores do mundo.

Desde miúda que gosto de cantar e a música popular portuguesa foi aquela que sempre me soou melhor ao ouvido, por ser tão simples reproduzir as estrofes cantadas em bom português. Porém, sempre senti uma grande discriminação por parte das pessoas ditas cultas, que menosprezavam a música portuguesa em detrimento da estrangeira, que enalteciam pela sua melodia e letras tão profundas e sentidas. Claro que se alguém traduzisse uma dessas letras iria compreender que nada fazia sentido, mas ainda assim a justificação estava no facto de em português não soar tão bem.

Ao fim de três décadas de existência continuo a defender a língua portuguesa como a mais rica, mais vasta e mais bonita de todas as línguas, a sexta mais falada no mundo. Assim sendo, defendo que se escreva em português e, se da escrita se fizer música, ainda melhor. Na realidade, há músicos portugueses que escrevem letras lindíssimas e que entram facilmente no ouvido pela harmonia da música que lhes dá vida. Não é fácil agradar ao povo e, por isso, quem quer ter retorno monetário pelo seu trabalho tem de agradar às massas e criar músicas que encham as festinhas da aldeia, assim como participar nos programas da manhã e da tarde, que ocupam a vasta população de reformados e das muitas donas de casa que há por esse país fora.  Contudo, eu ainda defendo aqueles músicos que se dedicam a escrever letras elaboradas e consistentes, que agradam a um nicho com pouco potencial de vendas, mas que representa a boa música que é feita no nosso país.

Um exemplo bem recente de coisas interessantes que se fazem na nossa língua é a música “A Chata” dos Ultraleve. Com uma letra extremamente divertida, uma melodia que lhe confere ritmo e cor, pode muito bem funcionar como um ícone da música portuguesa, que não é só fado e bailarico, mas também bandas rock e pop e tudo o que faz furor lá fora, onde não se cultiva a história do desgraçadinho popularucho, tão tipicamente português.

Saber o que gosta/ não gosta

Joana Nave, 24.02.13

Quantas vezes dou por mim a dizer: gosto disto, e disto, e mais isto, mas não gosto daquilo, e do outro, e mais outro. Parece simples definir os gostos de cada um, mas na verdade é uma tarefa muito difícil e da qual poucas vezes tomamos consciência. Há aquelas pessoas que são conhecidas por não gostarem de nada e outras que parece que gostam de tudo. O gosto de cada um varia vezes sem conta ao longo da vida e é bem mais fácil definir o que não se gosta do que o contrário. Os gostos definem a individualidade do ser humano, mas são ilimitados no alvo a que se referem. A importância de definir gostos facilita o relacionamento com os outros, pois pessoas semelhantes tendem a aproximar-se para partilhar o que têm em comum.

Quando penso na definição de gostos vem-me à memória o filme "Runaway Bride", em que Júlia Roberts é uma mulher que tem fobia ao casamento e por isso deixa sistematicamente os noivos no altar. Porém, a particularidade desta personagem está relacionada com o facto de não se conhecer a si mesma e por isso não saber o que quer. Claro que numa comédia romântica não pode faltar um homem interessante que desafia esta mulher a descobrir quem ela é, do que gosta e o que lhe dá prazer. Há uma cena caricata no filme em que ela resolve descobrir como gosta dos ovos, experimentando todas as formas em que podem ser confeccionados. A questão é que há coisas que temos de saber por nós mesmos como queremos e gostamos, pois a indefinição do gosto faz com que nos transformemos sempre na sombra de outra pessoa que não aquela que nós somos. Querer agradar aos outros é um gesto nobre se não nos anularmos a nós mesmos, se não deixarmos de ser quem somos. A identidade de cada indivíduo está assente num conjunto de gostos que o definem como fazendo parte de um determinado grupo. É difícil sermos totalmente diferentes uns dos outros até porque a vida em sociedade é mais fácil e enriquecedora. Se cada um de nós tiver de descobrir tudo sozinho, dificilmente poderá ir muito longe. No entanto, se soubermos o que realmente queremos e, de acordo com isso, nos aproximarmos dos nossos semelhantes, mais depressa atingiremos um bem-estar de equilíbrio e partilha no seio do grupo que nos define.

A vida que levamos é uma correria desenfreada assente em querer e ter. O tempo que dedicamos a conhecer-nos de verdade é limitado e, por isso, somos uma miscelânea de todos aqueles com quem nos cruzamos e que nos afectam de forma mais ou menos intensa. Costumo dizer que sei exactamente o que quero, mas quem me conhece bem diz que apenas sei o que não quero. Fico feliz, porque já é um princípio, agora resta-me abrandar o ritmo e entender realmente o que quero.